quinta-feira, 16 de dezembro de 2010

Pregação: Ficar..


“Senti até nojo, mas, se não ficasse, estaria sendo uma garota diferente das garotas da turma, e não seria mais aceita por ela”. Com esta, e algumas outras palavras, sugerindo sentimentos de perda, inadequação e até mesmo de humilhação, algumas adolescentes se referem à experiência de “ficar“.

Muitas vezes, por medo de não ser correspondido, de ser rejeitado, ou se decepcionar; por receio de não conseguir realizar uma experiência de namoro, o jovem, mesmo se censurado intimamente, mergulha num comportamento inadequado, agora chamado “ficar”.

De acordo com dados colhidos da internet, o rapaz que fica com várias garotas num mesmo evento é considerado “garanhão”. Mas quando é a garota que fica com vários garotos, então é chamada de “galinha”.

Diferenças que caracterizam considerações reveladoras de puro preconceito machista, numa época em que feministas gritam sua liberdade e até invertem os papéis transformando-se de vítimas em vilãs.

As mais variadas opiniões dão uma idéia do quanto este comportamento chamado “ficar” contrasta polarizadamente com a forma de relacionamento até pouco tempo atrás aceita no âmbito social.

Griffa (2001) refere-se ao ser humano como ser que contém, em seu interior, sua força real para relacionar-se com o mundo exterior. Porém, pode viver como uma coisa em meio a outras coisas, surgindo assim o que Pascal chama de “diversão”, Heidegger, de “existência inautêntica” e Marx de “alienação”.

O fato é que vemos a relação entre duas pessoas deixando de ser um encontro de trocas, de crescimento mútuo e se transformando apenas em uma busca egoísta da máxima satisfação dos desejos e necessidades sexuais. É uma espécie de servidão voluntária à sensualidade, onde se perde a autonomia, o auto-valor. Onde, para não ser excluída do grupo, a pessoa se reduz, se inferioriza.

Segundo a antologia de Viktor Frankl, o fundador da Logoterapia, “se tomamos um mesmo fenômeno e o projetamos em dimensões inferiores à que lhe é própria, resultam figuras individuais que se contradizem (fig. 1). Um cilindro (tridimensional) projetado tem sua sombra em forma de retângulo no plano vertical e em forma de círculo no plano horizontal. As sombras são do cilindro, mas o cilindro não é retângulo nem círculo (que são dimensões inferiores à sua totalidade).

Também o ser humano, quando evidenciado só na sua mente, ou só no seu corpo (como quando vive o “ficar”) está se inferiorizando, pois está sendo considerado fora do seu contexto, parcial e contraditoriamente limitado.

O corte com o passado e a falta de limites
Atualmente, o homem não se sente mais tão dependente da realidade social ou nacional, rejeita os padrões autoritários de educação, mas, paradoxalmente, ainda depende de modismos efêmeros que, principalmente a mídia, apresenta não como informação, mas como incitação ao erotismo geralmente vinculado à violência.

Há um processo de desconsideração das tradições positivas dos modelos. A destruição do passado é um dos fenômenos mais característicos e lúgubres do final do século XX. Quase todos os jovens de hoje crescem numa espécie de presente contínuo, sem qualquer relação orgânica com o passado público da época em que vivem, como que negando suas raízes e seus valores.

O desenraizamento é a mais perigosa doença das sociedades humanas. Somente criando raízes, assim como árvores, pode-se crescer, florescer, dar frutos e preservar a humanidade com as sementes. Sem raízes, como a árvore, a humanidade morre.

Faltam limites, faltam modelos. E isto leva o indivíduo a fazer o que bem entende, a “experimentar” às custas dos outros, como se tudo fosse uma brincadeira sem maiores conseqüências. Barbaridades, atos violentos são cada vez mais freqüentes e destruidores, sem nem mesmo deixar, no indivíduo que os pratica, arrependimento ou sentimento de culpa. Falta-lhe a incorporação de valores éticos e morais que lhe formem a consciência pessoal, capacitando-o a fazer julgamentos coerentes (veja-se como exemplo as famosas “pegadinhas” que atualmente ocupam grande espaço na mídia).

Confunde-se falta de limites com a verdadeira liberdade que é parte inerente do homem humanizado e realmente livre para escolher. Liberdade imprescindível para que se obtenham as dimensões dos limites, a descoberta de valores presentes em pessoas que poderão ser grandes guias positivos com seus modelos de vida.

A verdadeira liberdade não é escolher o que gostaria de fazer num determinado momento, mas escolher o bem verdadeiro para si mesmo e para os outros.

Propõe-se intervenção, principalmente na área da educação e cultura, que leve o ser humano a um desenvolvimento pleno na sua postura ética e cultural e à mudança de atitudes, favorecendo o exercício de sua “liberdade para”, visando um maior esvaziamento e reumanização da pessoa. Projetos comunitários trarão possibilidades de melhor autoconhecimento e nova visão de homem e de mundo com uma liberdade responsável que priorize a vida. O segredo continuará sendo sempre o mesmo: conjugar liberdade com responsabilidade, uma moeda com duas faces indissociáveis.



   texto: Maria do Carmo.

por: melka laiana

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